Eu acho que já escrevi aqui que sou uma pessoa estranha e que tenho assim uma grande quantidade de coisas que faço ou não faço e pelo menos duas fobias - uma é às aranhas e é uma coisa horrorosa que já me deu alguns momentos muito embaraçosos e aterrorizadores; a outra é... estão preparados? Pôr a cabeça debaixo de água.
Eu sei. É estranho, mas eu não ponho a cabeça debaixo de água. Digamos que é assim uma espécie de fobia. Falta-me o ar (literalmente, claro). Não sei explicar, mas entro em pânico e começo a imaginar que vou morrer sem respirar e só consigo recuperar quando estou bem à superficie e com ar à minha volta.
Eu não me lembro muito bem de como isto começou, mas acho que foi numa colónia de férias onde estava um primo meu e que nós fomos visitar um dia. Qualquer coisa ali para os lados da Praia das Maçãs.
A minha mãe nunca entrou no mar na vida dela, nem nunca vestiu um fato de banho tão pouco e é tão especial (leia-se estranha) ao ponto de dizer que ir à praia lhe causa infecções urinárias??????????
Não me façam perguntas dificeis, também nunca percebi.
Voltando à Praia das Maçãs...
Eu estava com a minha mãe e a minha tia e era pequenina, nem sei se não terá sido a minha primeira ida à praia. Uma senhora muito simpática que estava ali ao lado ofereceu-se para me levar à água. Até aqui tudo bem. Das minhas recordações tenho presente alguém a dizer-me: Se abrires os olhos vais ver o fundo do mar. Esqueceram-se de me dizer que não devia abrir o nariz, nem a boca. Não correu nada bem. É a memória mais antiga que tenho com água e com a cabeça lá dentro.
Eu sou a única pessoa que conheço que sai do banho com a cara seca. Adoro lavar a cara, não pensem que não lavo, mas com água fria no lavatório, nada de água de duche a correr pela cara abaixo, que até quando vejo nos outros me perturba imenso.
Por isso nunca entrei numa piscina de cabeça, vulgo mergulho. Mas é que nem pensar. Eu entro pela escada como as pessoas civilizadas e as minhas filhas sabem que a pior coisa que pode haver para a estranha mãezinha delas é atirarem-me água à cara. Ou para cima no geral, porque odeio água fria e o meu termostato é muito diferente do das outras pessoas. O que para a generalidade da humanidade é uma água maravilhosa, para mim é um gelo. Nem queiram saber como é a água do meu banho. Mas só vos digo que ninguém consegue tomar banho comigo...
Aqui há uns anos estava de férias com o meu marido no Brasil. Tinhamos chegado no dia 30 de dezembro, felizes e contentes, pelo menos eu que adoro calor, para passarmos o reveillon. Como chegámos à noite já só tinha o dia 31 para ganhar uma corzinha que me tirasse o tom doentio de inverno que levamos deste país da treta cheio de frio.
Chegámos e fomos direitos à Praia do Forte. Picanha, caipirinha, cervejinha, matar saudades dos sabores da terra. Daí fomos para casa e quando chegámos a Iraci, que é uma pessoa maravilhosa tinha apanhado uns abacaxis no quintal e guardado para mim na cozinha. Comi um inteiro. Vá, não façam essa cara, são muito mais pequeninos do que os de cá e mais estreitos também. Mas são tão boooons. Até perfumam a boca.
Deitei-me cansadinha das nove horas de avião e dormi lindinha até me cheirar a café. A Iraci faz café como o das nossas avós, tipo cafe de cafeteira. Uma maravilha, acordar com o cheirinho a café, abrir a porta do quarto e dar de caras com uma mesa com fruta, café, pão, queijinho de Minas...
Tomei o pequeno almoço e praia com ela. Apanhei sol, comi mais umas coisinhas, bebi uns suquinhos, maravilhosos, como sempre e almocei uma bela moqueca de camarão com arroz branco, saladinha e muita cervejinha. Estão a anotar a quantidade de comida que eu já tinha no estômago por esta altura? É que é muito importante para o desenrolar da história.
Quando estavamos a acabar de almoçar apareceram uns amigos nossos de Portugal que também tinham chegado para o reveillon. Sentaram-se, acabamos de comer todos juntos e entretanto convidaram-nos para dar um passeio de barco ao longo da costa.
Vamos embora pensei eu, no meio da água vou ficar preta num instante. Lá fomos nós para um antigo barco de pesca (muito antigo), com um cheiro inacreditável a gasoleo.
Eu até nem enjoo em barcos, tenho carta de marinheiro e tudo, por isso não se ponham a fazer contas de cabeça.
Ao fim de um bocado comecei a sentir uma nausea muito familiar e recorrente durante as minhas diversas idas ao Brasil. Tentei ignorar, nem sei porquê porque já estou cansada de saber que não resulta.
Mas é que odeio vomitar.
Aguentei até conseguir e quando já não podia mais meti a cabeça para fora do barco e comecei a vomitar...
Vocês não me conhecem, mas eu quando começo... Já cheguei a fazer uma viagem do Algarve até ao Cartaxo sempre a vomitar. Só para terem noção.
Estava super mal disposta e o cheiro do barco começou a tomar conta da minha cabeça. Não me conseguia abstrair... Estava a ficar cada vez mais intenso. E eu vomitava, e vomitava, e... pronto já perceberam!
Às tantas não aguentei mais. Pensei: "prefiro morrer afogada do que com este cheiro". É verdade, sou uma pessoa muito dramática, mas estava mesmo mal disposta.
Atirei-me do barco para aí a uns 150m da costa, pelo menos é o que o meu marido diz. Quando ele me viu a sair disparada do barco pensou que eu estava doida e que tinha que estar muito aflita para me sujeitar a meter a cabeça debaixo de água. Atirou-se atrás de mim, claro, que se ficasse viúvo tinha que cuidar das miúdas e da gata sózinho. E acho que também um bocadinho porque gosta de mim. Não sei como mas consegui nadar até quase à praia. E digo não sei como porque eu a nadar sou uma coisa maravilhosa e as minhas filhas até costumam dizer que eu inventei um novo estilo - bruços mas com a cabeça sempre à tona e muito direitinha. Pronto.
Quando cheguei à praia, já com o meu marido a apoiar-me estava semi desmaiada, (há partes que não me lembro), cheia de frio, fico sempre cheia de febre com estas coisas, e só levantava a cabeça para continuar a vomitar.
Acreditem ou não vomitei até ao abacaxi da noite anterior. Imaginem lá como é que o meu estomago estava.
Fiquei não sei quanto tempo na praia com a cabeça deitada no colo do meu marido, a vomitar nada, porque já tinha o estômago vazio e cheia de frio.
Os nossos amigos regressaram e levaram toalhas para me taparem enquanto decidiam o que fazer com o meu quase cadáver... (estão a ver a tal veia dramática?).
Perdi a noção do tempo, lembro-me ouvir uma brasileira a dizer:
- Nossa eu acho que ela tá morta, viu? Porque tem as unhas tudo roxo...
E eu a pensar: A mulher tá parva coitada, não estou nada morta, estou a ouvi-la muito bem e a deixar de ouvir tudo outra vez.
Os nossos amigos queriam chamar um médico, mas o meu marido que infelizmente já está habituado a estas coisas, sossegou-os:
-Quando ela estabilizar levo-a para casa. A empregada tem lá um chá que lhe costuma fazer muito bem.
coitadinho, já me aturou tantas destas. Normalmente nas férias. Uma vez em Barcelona... fica para outra vez.
Já começava a escurecer quando me conseguiram levantar e levar até ao hotel onde eles estavam que era ali muito pertinho.
Deitaram-me numa cadeirinha da piscina, taparam-me com cobertores ou com um edredon, estavam para aí uns 30 graus, mas eu tremia...
Deram-me água morna a beber, e fui estabilizando. Comecei a pedir água e finalmente pedi para ir para casa.
Isto até pode parecer fácil, mas esperavam-me assim uns sete quilómetros por um caminho de terra batida, que é buraco, buraco, buraco...
Levantei-me, deitei toda a água que tinha bebido fora de um jato e lá consegui chegar ao carro e daí a casa.
Não preciso de dizer que a minha passagem de ano foi na caminha, meia em coma, como fico sempre quando tenhas estas coisas e a do meu marido no terraço lá de casa a brindar sozinho ao ano novo com uma cerveja na mão. Tadinho. Nem sei como ele me atura.
Foi a única vez na minha vida que meti voluntaria ou involuntariamente a cabecinha debaixo de água. E espero não repetir a experiência.
Um dia destes conto-vos o meu problema com as aranhas.
Ainda se vão rir...
segunda-feira, 23 de janeiro de 2012
sábado, 14 de janeiro de 2012
Eu e os livros
A minha relação com os livros é tão antiga na minha vida como a minha relação com os tachos. Não acreditam? Pois para que conste eu com 4 anos já sabia ler. E bem!
Mas não faz mal que não acreditem. Na altura também ninguém acreditou em mim, as crianças são sempre incompreendidas. Eu que o diga!
Mas vamos ao que interessa.
Eu tinha quatro anos e fiquei doente pela primeira vez (lembram-se da história da injecção? Pois foi dessa vez) e como naquela época tão pré-histórica não havia Playstation, PSP, computadores ou sequer televisão no quarto, o que também não havia de valer muito a pena com apenas dois canais, e como eu nunca fui muito boa a estar quieta, chegou a uma altura em que já ninguém me podia aturar lá em casa e estavam capazes de me dar o que quer que fosse para eu deixar de me queixar da vidinha. Não se esqueçam que eu tinha quatro anos.
Adiante. Um dia depois do jantar, o meu pai e o meu padrinho, que morava connosco, antes de sairem para beber café perguntaram-me se eu queria que me trouxessem alguma coisa.
- Quero. Tragam-me livros daqueles que estão ao lado do balcão com o Mickey e o Pateta.
- Livros? Para que é que tu queres os livros? Nem sequer sabes ler.
- Sei sim senhor! Sei ler muito bem. Tragam-me lá os livros que eu já mostro se sei ou não sei. (Sempre fui tão refilona, graças a Deus).
- Pronto, pronto, não te zangues. Nós trazemos-te os livros.
E trouxeram. Eram dois livrinhos pequeninos, não sei explicar bem porque agora não vejo nada do género a vender, mas eram da Disney e tinham tipo um desenho em cima e um bocadinho de história em baixo ou ao contrário. Um era do Mickey e do seu fiel cãozinho Pluto e o outro do Goofy, que como todos sabemos é o Pateta.
- Lê lá ó espevitada. Já que sabes ler tão bem.
E eu li. Ah pois foi, calei-os num instantinho. Não lia rapidamente, mas conhecia as letras e sabia juntá-las e formar as palavras.
Ficou tudo de boca aberta, sem perceber nada do que se estava a passar.
Mas tudo na vida tem uma explicação e infelizmente tenho que admitir que, por muito que isso me agradasse, não sou nenhum génio.
A minha mãe trabalhava em casa de costura e para me entreter, e eu não era fácil, porque nunca me calava, comprou um livro da 1ª classe (para os mais novos, 1º ano do ensino básico) e ia-me mostrando as imagens e dizendo as letras - 'a' de águia, 'e' de égua, 'i' de igreja, 'o' de ovo e 'u' de uva. O livro continuava com o abecedário muito bem explicado com uns desenhos amorosos dos quais ainda me lembro muito bem (agora tenho 45 anos, mas continuo a falar pelos cotovelos) e na parte final quando era suposto já se saber juntar as letras, tinha algumas histórias.
Ainda me lembro que uma delas era o "Milagre das Rosas", aquela história da rainha Santa Isabel, que transformou o pão em rosas, lembram-se?
De tanto repetir fui memorizando as letrinhas. Sempre tive uma memória fantástica, agora é que estou um bocadinho mais esquecida, mas claro que é da idade. Ai...
Enfim, a minha mãe estava convencida que eu sabia o livro de cor e por isso quando eu pegava e 'lia' as histórias do mesmo, ela achava que eu estava só a 'fazer género'. Vou voltar a dizer, as crianças são sempre incompreendidas.
Por isso imaginem as caras deles a olharem para mim e verem uma verdadeira amostra de gente (eu fui sempre mínima) a debitar uma história que nunca tinha visto na vidinha.
E claro que nem preciso de dizer que levaram comigo no fim.
- Então? Sei ler ou não sei? Mas porque é que nunca ninguém acredita em mim? Se eu disse que sabia é porque sabia não é? Se não não dizia.
A lógica infantil é imbatível.
- Sabes sim senhora, muito bem, mas como é que aprendeste?
Pronto tive que lhes explicar o b-a, ba.
A partir daí nunca mais parei. Natal, aniversários, as minhas listas eram sempre de livros. Ainda hoje são, só que agora também incluem acessórios de cozinha...
Devia ter uns nove anos quando me ofereceram o primeiro volume de "Retalhos da Vida de Um Médico", de Fernando Namora, uns meses antes de começar a passar a série na televisão.
Nessa altura já tinha devorado tudo o que Enid Blyton tinha escrito, Cinco, Sete, Cinco Descobridores e o Seu Cão, Colégio das Quatro Torres, Colégio de Santa Clara...
Já tinha lido algumas coisas de Camilo Castelo Branco e Eça de Queirós e a dona da livraria onde o meu pai costumava comprar os meus livros já não sabia que mais havia de recomendar porque achava que eu ainda era muito miúda. Portanto lembro-me que quando abri os meus presentes no dia de Natal desse ano, (na minha infância abriam-se no dia 25 e era o Menino Jesus que os dava, o pai Natal é uma invenção da Coca-Cola), descobri os dois volumes de Retalhos da Vida de Um Médico e um mundo completamente novo para mim. Foi preciso ameaçarem-me para me sentar à mesa, já com metade do primeiro volume lido.
Fiquei apaixonada de tal forma que enquanto não consegui ter os livros dele todos, guardei todo o meu dinheiro de semanadas, padrinhos, tios, tudo para a livraria e acho que chorei quando ele morreu, ja eu era adolescente. Era uma emoção chegar a casa com um livro novo e aquele cheirinho do papel, que ainda hoje amo, e descobrir personagens tão diferentes, vivências... mundos completamente novos para mim.
Depois veio Júlio Dinis, Júlio Verne, passei a fase policial, entrei no romance, lia tudo, mas mesmo tudo o que apanhava a uma velocidade que era impossível de descrever.
Uma paixão que descobri com quatro anos e que me ficou para a vida. Posso entrar e sair de uma loja de roupa sem nada, de uma sapataria, perfumaria, o que for, mas de uma livraria é dificil. Adoro a Bertrand que existe no shopping ao pé da minha casa e onde os empregados já me conhecem para lá de bem. É preciso estar muuuuuuuuuuuuito em baixo de finanças para resistir a um novo título. Adoro livros com histórias reais, romances históricos, romances, poesia, basicamente tudo.
Adoro ler.
O melhor emprego que tive na minha vida foi a escrever as páginas de literatura da revista Focus - pagavam-me para ler e ainda por cima me mandavam os livros. Era mesmo bom. Ficava estendida no sofá a 'trabalhar'. Arduamente, garanto que nessa altura trabalhava sempre arduamente.
Quando vou de férias levo sempre um carregamento de livros, normalmente um meio a dois por dia, dependendo do tema, do autor, do número de páginas. O meu marido fica doente:
- Precisas mesmo de levar isso tudo? Não podes comprar lá?
Não, não posso. Preciso de os escolher com calma, de os 'saborear' e decidir o que levar já faz parte do gozo das férias.
PORQUE É QUE NINGUÉM ENTENDE?
A par de cozinhar, ler é das coisas que mais gosto de fazer e aquela que me permite alhear-me do mundo.
Consegui passar esta paixão às minhas filhas. Não tão intensa, mas adoram ler o que me deixa muito feliz.
Tenho tanta pena das pessoas que dizem não gostar de ler.
Entrar num livro, na história, na cabeça das personagens, criar um filme na nossa cabeça é muito bom.
Por isso odeio os filmes dos livros. São tão insípidos. Nunca conseguem transmitir nada daquilo que eu estou à espera.
O meu livro de cabeceira? São tantos... A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, Os Cisnes Selvagens, Memórias de Uma Gueixa, Fauziya Kasinga - As Lágrimas do Silêncio (Mutilação Genital Feminina), Amanhecer, sei lá, são tantos.
O que estou a ler agora? Dei-te o Melhor de Mim, Nicholas Sparks e Raparigas da Villa de Nicki Pellegrino.
O que vou ler a seguir?
Ainda não sei, mas apetece-me voltar a reler algumas coisas como Os Maias e O Monte dos Vendavais, que uma amiga me ofereceu há algum tempo e que adorei.
Mas não faz mal que não acreditem. Na altura também ninguém acreditou em mim, as crianças são sempre incompreendidas. Eu que o diga!
Mas vamos ao que interessa.
Eu tinha quatro anos e fiquei doente pela primeira vez (lembram-se da história da injecção? Pois foi dessa vez) e como naquela época tão pré-histórica não havia Playstation, PSP, computadores ou sequer televisão no quarto, o que também não havia de valer muito a pena com apenas dois canais, e como eu nunca fui muito boa a estar quieta, chegou a uma altura em que já ninguém me podia aturar lá em casa e estavam capazes de me dar o que quer que fosse para eu deixar de me queixar da vidinha. Não se esqueçam que eu tinha quatro anos.
Adiante. Um dia depois do jantar, o meu pai e o meu padrinho, que morava connosco, antes de sairem para beber café perguntaram-me se eu queria que me trouxessem alguma coisa.
- Quero. Tragam-me livros daqueles que estão ao lado do balcão com o Mickey e o Pateta.
- Livros? Para que é que tu queres os livros? Nem sequer sabes ler.
- Sei sim senhor! Sei ler muito bem. Tragam-me lá os livros que eu já mostro se sei ou não sei. (Sempre fui tão refilona, graças a Deus).
- Pronto, pronto, não te zangues. Nós trazemos-te os livros.
E trouxeram. Eram dois livrinhos pequeninos, não sei explicar bem porque agora não vejo nada do género a vender, mas eram da Disney e tinham tipo um desenho em cima e um bocadinho de história em baixo ou ao contrário. Um era do Mickey e do seu fiel cãozinho Pluto e o outro do Goofy, que como todos sabemos é o Pateta.
- Lê lá ó espevitada. Já que sabes ler tão bem.
E eu li. Ah pois foi, calei-os num instantinho. Não lia rapidamente, mas conhecia as letras e sabia juntá-las e formar as palavras.
Ficou tudo de boca aberta, sem perceber nada do que se estava a passar.
Mas tudo na vida tem uma explicação e infelizmente tenho que admitir que, por muito que isso me agradasse, não sou nenhum génio.
A minha mãe trabalhava em casa de costura e para me entreter, e eu não era fácil, porque nunca me calava, comprou um livro da 1ª classe (para os mais novos, 1º ano do ensino básico) e ia-me mostrando as imagens e dizendo as letras - 'a' de águia, 'e' de égua, 'i' de igreja, 'o' de ovo e 'u' de uva. O livro continuava com o abecedário muito bem explicado com uns desenhos amorosos dos quais ainda me lembro muito bem (agora tenho 45 anos, mas continuo a falar pelos cotovelos) e na parte final quando era suposto já se saber juntar as letras, tinha algumas histórias.
Ainda me lembro que uma delas era o "Milagre das Rosas", aquela história da rainha Santa Isabel, que transformou o pão em rosas, lembram-se?
De tanto repetir fui memorizando as letrinhas. Sempre tive uma memória fantástica, agora é que estou um bocadinho mais esquecida, mas claro que é da idade. Ai...
Enfim, a minha mãe estava convencida que eu sabia o livro de cor e por isso quando eu pegava e 'lia' as histórias do mesmo, ela achava que eu estava só a 'fazer género'. Vou voltar a dizer, as crianças são sempre incompreendidas.
Por isso imaginem as caras deles a olharem para mim e verem uma verdadeira amostra de gente (eu fui sempre mínima) a debitar uma história que nunca tinha visto na vidinha.
E claro que nem preciso de dizer que levaram comigo no fim.
- Então? Sei ler ou não sei? Mas porque é que nunca ninguém acredita em mim? Se eu disse que sabia é porque sabia não é? Se não não dizia.
A lógica infantil é imbatível.
- Sabes sim senhora, muito bem, mas como é que aprendeste?
Pronto tive que lhes explicar o b-a, ba.
A partir daí nunca mais parei. Natal, aniversários, as minhas listas eram sempre de livros. Ainda hoje são, só que agora também incluem acessórios de cozinha...
Devia ter uns nove anos quando me ofereceram o primeiro volume de "Retalhos da Vida de Um Médico", de Fernando Namora, uns meses antes de começar a passar a série na televisão.
Nessa altura já tinha devorado tudo o que Enid Blyton tinha escrito, Cinco, Sete, Cinco Descobridores e o Seu Cão, Colégio das Quatro Torres, Colégio de Santa Clara...
Já tinha lido algumas coisas de Camilo Castelo Branco e Eça de Queirós e a dona da livraria onde o meu pai costumava comprar os meus livros já não sabia que mais havia de recomendar porque achava que eu ainda era muito miúda. Portanto lembro-me que quando abri os meus presentes no dia de Natal desse ano, (na minha infância abriam-se no dia 25 e era o Menino Jesus que os dava, o pai Natal é uma invenção da Coca-Cola), descobri os dois volumes de Retalhos da Vida de Um Médico e um mundo completamente novo para mim. Foi preciso ameaçarem-me para me sentar à mesa, já com metade do primeiro volume lido.
Fiquei apaixonada de tal forma que enquanto não consegui ter os livros dele todos, guardei todo o meu dinheiro de semanadas, padrinhos, tios, tudo para a livraria e acho que chorei quando ele morreu, ja eu era adolescente. Era uma emoção chegar a casa com um livro novo e aquele cheirinho do papel, que ainda hoje amo, e descobrir personagens tão diferentes, vivências... mundos completamente novos para mim.
Depois veio Júlio Dinis, Júlio Verne, passei a fase policial, entrei no romance, lia tudo, mas mesmo tudo o que apanhava a uma velocidade que era impossível de descrever.
Uma paixão que descobri com quatro anos e que me ficou para a vida. Posso entrar e sair de uma loja de roupa sem nada, de uma sapataria, perfumaria, o que for, mas de uma livraria é dificil. Adoro a Bertrand que existe no shopping ao pé da minha casa e onde os empregados já me conhecem para lá de bem. É preciso estar muuuuuuuuuuuuito em baixo de finanças para resistir a um novo título. Adoro livros com histórias reais, romances históricos, romances, poesia, basicamente tudo.
Adoro ler.
O melhor emprego que tive na minha vida foi a escrever as páginas de literatura da revista Focus - pagavam-me para ler e ainda por cima me mandavam os livros. Era mesmo bom. Ficava estendida no sofá a 'trabalhar'. Arduamente, garanto que nessa altura trabalhava sempre arduamente.
Quando vou de férias levo sempre um carregamento de livros, normalmente um meio a dois por dia, dependendo do tema, do autor, do número de páginas. O meu marido fica doente:
- Precisas mesmo de levar isso tudo? Não podes comprar lá?
Não, não posso. Preciso de os escolher com calma, de os 'saborear' e decidir o que levar já faz parte do gozo das férias.
PORQUE É QUE NINGUÉM ENTENDE?
A par de cozinhar, ler é das coisas que mais gosto de fazer e aquela que me permite alhear-me do mundo.
Consegui passar esta paixão às minhas filhas. Não tão intensa, mas adoram ler o que me deixa muito feliz.
Tenho tanta pena das pessoas que dizem não gostar de ler.
Entrar num livro, na história, na cabeça das personagens, criar um filme na nossa cabeça é muito bom.
Por isso odeio os filmes dos livros. São tão insípidos. Nunca conseguem transmitir nada daquilo que eu estou à espera.
O meu livro de cabeceira? São tantos... A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, Os Cisnes Selvagens, Memórias de Uma Gueixa, Fauziya Kasinga - As Lágrimas do Silêncio (Mutilação Genital Feminina), Amanhecer, sei lá, são tantos.
O que estou a ler agora? Dei-te o Melhor de Mim, Nicholas Sparks e Raparigas da Villa de Nicki Pellegrino.
O que vou ler a seguir?
Ainda não sei, mas apetece-me voltar a reler algumas coisas como Os Maias e O Monte dos Vendavais, que uma amiga me ofereceu há algum tempo e que adorei.
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