Eu tinha sete anos no dia 25 de Abril de 1974.
Andava na 2ª classe e recordo-me de acordar e ouvir os aviões da Base Aérea de Alverca a sobrevoarem a minha casa.
- Oh mãe, o que é que se passa?
- É a guerra, vão levar tudo...
Tudo? Ai, os meus brinquedos, pensei eu. Lembro-me tão bem.
Sempre fui muito ciosa das minhas propriedades, que na altura se limitavam a tachinhos, panelinhas, alguidares, chávenas, pratos, etc. Tinha um saco enorme cheio de tralha que o meu padrinho me trazia da fábrica do Omo, onde trabalhava.
O Omo, para os mais novos, era um detergente em pó para lavar roupa à mão, numa altura em que poucas pessoas tinham máquina de lavar roupa, e que trazia uns brindes nos pacotes. Normalmente uns brinquedos em plástico, de que eu tinha assim uma quantidade industrial.
Lembro-me particularmente de uma balança daquelas antigas com dois pratos que eu adorava de paixão. Sempre fui muito ligada à cozinha...
Pensando na tal "guerra", (a minha mãe ainda é mais dramática que eu), resolvi tomar medidas drásticas.
Abri um buraco no quintal e tratei de pôr as minhas coisas a salvo. Meti todos os meus pequenos brinquedos, na verdade e pensando bem no assunto, os meus primeiros utensílios de cozinha, no buraco e tapei-os novamente.
"Podem levar tudo, menos as minhas coisas", pensei.
Lembro-me tão bem.
Arranjei-me e fui para a escola, de onde voltei recambiada e contrariada, para casa, porque havia uma revolução, palavra desconhecida para mim, e portanto nada de aulas.
Depois lembro-me das músicas na televisão, o "Grândola Vila Morena", "Depois do Adeus", uma de que não sei o nome mas que tinha uma estrofe: "Vi as portas da prisão abertas de par em par, vi passar a procissão do meu país a cantar, agora o povo unido, nunca mais será vencido...". As coisas de que me lembro. O meu disco rígido é ilimitado para estas porcarias...
Aos poucos fui adquirindo outros conhecimentos sobre o dia em que não tive escola e percebendo a importância que isso tinha para as pessoas, para o país.
Aos sete anos a perspectiva de um país mais livre não me dizia grande coisa. Lamento, mas os meus brinquedos eram muito mais importantes para mim.
Anos mais tarde, por volta dos anos oitenta, na altura em que Portugal descobriu as marquises, uma coisa que nunca devia ter sido inventada, de tão feia que é, os meus pais, sempre muito atualizados nestas coisas, também construiram a sua marquise.
Onde?
Exatamente por cima dos meus brinquedos que ainda estavam enterrados onde os escondi para os proteger da "guerra" e onde ainda hoje estão.
Imaginem daqui a uns milhares de anos, as civilizações futuras a procederem a escavações naquele sítio e as notícias das descobertas: "No século vinte as pessoas eram minúsculas. Vejam o tamanho dos seus utensílios de cozinha". E tudo por culpa de uma cachopa dramática que resolveu proteger de forma radical as suas preciosas propriedades.
E já agora ficam a saber que continuo tão dramática como era no dia 25 de Abril de 1974.
quarta-feira, 25 de abril de 2012
O que aprendi com as minhas filhas?
É daquelas perguntas que nunca tinha colocado a mim mesma.
Mas hoje estava a ler um artigo na revista Activa onde a questão é colocada e fiquei a pensar no assunto.
O que aprendi com as minhas filhas?
Acima de tudo aprendi a amar incondicionalmente. Aprendi que o bem estar, a felicidade, o sorriso das minhas filhas são as coisas mais importantes do mundo para mim.
Lembro-me do dia em que nasceram e olhei para elas pela primeira vez e senti o coração tão cheio de um sentimento tão novo.
E lembro-me de sentir um medo enorme que dura até hoje.
Medo de não conseguir, de não ser suficiente, de não ser boa mãe, de não me amarem como eu as amo a elas, de... tudo!!!
As mães têm medo de tudo. É uma coisa horrivel, que não se consegue controlar e que nos leva a fazer coisas que nos parecem depois completamente ridiculas.
Eu tenho algumas dessas coisas que as minhas filhas me recordam de vez em quando entre gargalhadas de puro gozo com os meus medos.
"Oh mãe, és tão dramática".
Pois sou. Muito dramática mesmo. É uma tragédia, mas infelizmente para as três não há nada que eu possa fazer para evitar. É assim uma daquelas coisas que eu vou levar comigo para o forno (eu quero ser cremada quando morrer, por isso não posso dizer para a cova...).
Voltando ao que aprendi com elas...
Aprendi que posso ser uma pessoa muito obcecada. O meu instinto animal, como elas dizem, é verdadeiramente selvagem, quando alguém se mete com as minhas loiras.
Não há nada a fazer, instinto animal e amor e medo maternal são uma mistura explosiva.
Aprendi que sou muito teimosa... A mais nova tem muita coisa de feitio em comum comigo e, se por isso, muitas vezes percebo bem as reações dela, também percebo o quanto posso exasperar as pessoas.
Aprendi que posso ser capaz de matar alguém que as faça sofrer e odiar pessoas de paixão.
Aprendi que estou sempre desactualizada em termos musicais: "Tu só ouves as músicas da M80". É mentira, ouço outras coisas, mas nada que elas considerem música.
Aprendi que a cumplicidade entre as duas acaba sempre por se virar contra mim. Em caso de dúvida estamos as duas contra a mãe.
Aprendi que sou capaz de controlar muita coisa em mim para as proteger.
Aprendi que posso comer pizza para lhes fazer companhia.
Aprendi a viver com barulho e passei a adorar ter os amigos delas em casa para as ter mais ao pé de mim. E que gosto genuinamente deles e que nem todos os adolescentes são "rascas". Alguns até são miúdos fantásticos.
Aprendi que ser mãe significa deixar crescer, largar, que cortar o cortão umbilical não é coisa do momento do parto, mas sim uma coisa para a vida. Todos os dias cortamos um bocadinho. E todos os dias dói, mas também nos dá uma enorme sensação de orgulho. É que cada corte significa que elas cresceram mais um bocadinho.
Aprendi o que é ter alguém dentro de nós durante nove meses em que me senti tão feliz e completa e de repente a sensação de vazio quando elas nasceram.
Aprendi a lidar com namorados, amigos, professores, pais dos amigos, festivais de verão, férias com os amigos, medo...
Aprendi tanto com as minhas filhas. Aprendo todos os dias e desejo muito que elas também aprendam comigo. Mas isso só elas poderão dizer.
E isto foi outra coisa que aprendi, a sentir-me sempre na dúvida. Será que estou a fazer isto bem?
Resumindo: Amor, orgulho, dúvida, respeito, proteção, crescimento, apendizagem, vida. Tudo isto as minhas filhas me ensinam todos os dias.
E esta aprendizagem ainda mal começou...
Porque isto de ser mãe é coisa para durar até ao forno!
Mas hoje estava a ler um artigo na revista Activa onde a questão é colocada e fiquei a pensar no assunto.
O que aprendi com as minhas filhas?
Acima de tudo aprendi a amar incondicionalmente. Aprendi que o bem estar, a felicidade, o sorriso das minhas filhas são as coisas mais importantes do mundo para mim.
Lembro-me do dia em que nasceram e olhei para elas pela primeira vez e senti o coração tão cheio de um sentimento tão novo.
E lembro-me de sentir um medo enorme que dura até hoje.
Medo de não conseguir, de não ser suficiente, de não ser boa mãe, de não me amarem como eu as amo a elas, de... tudo!!!
As mães têm medo de tudo. É uma coisa horrivel, que não se consegue controlar e que nos leva a fazer coisas que nos parecem depois completamente ridiculas.
Eu tenho algumas dessas coisas que as minhas filhas me recordam de vez em quando entre gargalhadas de puro gozo com os meus medos.
"Oh mãe, és tão dramática".
Pois sou. Muito dramática mesmo. É uma tragédia, mas infelizmente para as três não há nada que eu possa fazer para evitar. É assim uma daquelas coisas que eu vou levar comigo para o forno (eu quero ser cremada quando morrer, por isso não posso dizer para a cova...).
Voltando ao que aprendi com elas...
Aprendi que posso ser uma pessoa muito obcecada. O meu instinto animal, como elas dizem, é verdadeiramente selvagem, quando alguém se mete com as minhas loiras.
Não há nada a fazer, instinto animal e amor e medo maternal são uma mistura explosiva.
Aprendi que sou muito teimosa... A mais nova tem muita coisa de feitio em comum comigo e, se por isso, muitas vezes percebo bem as reações dela, também percebo o quanto posso exasperar as pessoas.
Aprendi que posso ser capaz de matar alguém que as faça sofrer e odiar pessoas de paixão.
Aprendi que estou sempre desactualizada em termos musicais: "Tu só ouves as músicas da M80". É mentira, ouço outras coisas, mas nada que elas considerem música.
Aprendi que a cumplicidade entre as duas acaba sempre por se virar contra mim. Em caso de dúvida estamos as duas contra a mãe.
Aprendi que sou capaz de controlar muita coisa em mim para as proteger.
Aprendi que posso comer pizza para lhes fazer companhia.
Aprendi a viver com barulho e passei a adorar ter os amigos delas em casa para as ter mais ao pé de mim. E que gosto genuinamente deles e que nem todos os adolescentes são "rascas". Alguns até são miúdos fantásticos.
Aprendi que ser mãe significa deixar crescer, largar, que cortar o cortão umbilical não é coisa do momento do parto, mas sim uma coisa para a vida. Todos os dias cortamos um bocadinho. E todos os dias dói, mas também nos dá uma enorme sensação de orgulho. É que cada corte significa que elas cresceram mais um bocadinho.
Aprendi o que é ter alguém dentro de nós durante nove meses em que me senti tão feliz e completa e de repente a sensação de vazio quando elas nasceram.
Aprendi a lidar com namorados, amigos, professores, pais dos amigos, festivais de verão, férias com os amigos, medo...
Aprendi tanto com as minhas filhas. Aprendo todos os dias e desejo muito que elas também aprendam comigo. Mas isso só elas poderão dizer.
E isto foi outra coisa que aprendi, a sentir-me sempre na dúvida. Será que estou a fazer isto bem?
Resumindo: Amor, orgulho, dúvida, respeito, proteção, crescimento, apendizagem, vida. Tudo isto as minhas filhas me ensinam todos os dias.
E esta aprendizagem ainda mal começou...
Porque isto de ser mãe é coisa para durar até ao forno!
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